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Coluna: Furando a Bolha (19/05)

qua, 19 de maio de 2021 08:20

por Leandro Alves de Melo

Fake News (Vol. 3)

Nos últimos dois textos comentei a respeito deste fenômeno que assola o mundo contemporâneo: as fake news. No texto de hoje, tomo a liberdade de escrever de forma opinativa-subjetiva, trazendo o meu ponto de vista sobre esse assunto que verdadeiramente me preocupa.

No primeiro, afirmei que aprofundaria sobre os algoritmos das redes sociais que nos fazem entrar em bolhas. Mas que diabo é isso? Tenho certeza que alguns se perguntaram. Algoritmos são, de forma simplista, programas que os computadores utilizam para prender a nossa atenção. Portanto, à medida que os utilizamos, eles aprendem sobre nossos gostos, pesquisas, interesses etc. Até aí tudo bem… O problema começa quando pensamos que, para as empresas de tecnologia, quanto mais tempo a gente ficar no Facebook, Instagram ou Twitter, por exemplo, melhor, conquanto aumente a probabilidade de efetuarem uma venda ou algo que aumente os lucros dessas companhias. Como diz um velho jargão da tecnologia, “se não paga pelo produto, você é o produto”. Possivelmente, no momento em que pesquisou para comprar algo, imediatamente começará a aparecer nesses meios propagandas exatamente daquilo que você buscava. Alguns dizem que só de pensar em uma máquina lava e seca aparecerá, logo em seguida, na sua linha do tempo do Facebook, por exemplo (e claro que é fake news essa última frase).

Dessa maneira, de certa forma, incentiva-se notícias que atraem publicidade e cliques. E é aí que o problema se agrava. Pouco importa se essa notícia não tem base científica ou qualquer lastro de confiabilidade. Na verdade, quanto mais ad absurdum for, melhor. O que importa é se despertará interesse no internauta. Assim, se você vir uma notícia afirmando que descobriram a cura do Covid-19 apenas dando três pulos e uma eructação, com certeza, mesmo não tendo nenhum supedâneo com a realidade, a pessoa clicará nela ao invés de ler a fala de um médico, em uma outra notícia, explicando como se prevenir e cuidar, da maneira correta. A segunda notícia, embora verdadeira, não terá a mesma adesão.

Esse exemplo ilustra um processo mundial de notícias mentirosas e teorias da conspiração. Com o aumento exponencial de internautas e também com a democratização da web, muitos, por imaturidade, falta de destreza ou desconhecimento intelectual, caem facilmente nessas armadilhas — que abarcam desde uma teoria questionando a forma geoide da terra, afirmando que se trata de uma superfície plana, até outras mais graves, como a inexistência do Covid-19, ou então teorias políticas mais elaboradas, como o Q-anon.

O Q-anon foi uma teoria conspiratória propagada pela extrema-direita americana que afirmava que políticos, como o atual presidente Biden, Hilary Clinton e Barack Obama, eram adoradores de Satanás, e que estes faziam orgias e canibalismo com crianças. É, caro leitor, é de torcer o nariz. Um absurdo desse conseguiu fazer um exército de fanáticos e gerou severos danos para a nação americana. Cito como exemplo a apoiadora de Trump e dessa teoria, Ashli Babbit, de 35 anos, que, em suas redes sociais, alegava fraude nas eleições americanas, propagava e acreditava fielmente na teoria Q-anon, abandonou sua família e viajou milhares de quilômetros para invadir o capitólio. Ela, tragicamente, morreu com um tiro na cabeça, tentando adentrar no prédio do congresso americano. Percebam como a crença em uma mentira e o fanatismo levou a vida dessa cidadã.

Pessoas que estão em um mau momento, às vezes por conta da perda de alguém querido, problemas financeiros ou término de um relacionamento, de uma maneira geral, tendem a ver a vida com uma lente preta e branca. A partir daí, é natural que, quando estimuladas por notícias pessimistas e, muitas vezes, conspiratórias, e que reforçam suas crenças particulares, por mais que não tenha conexão com a realidade, o sujeito tende a acreditar e a compartilhar tais fatos, podendo, inclusive, direcionar-se ao radicalismo. Algumas até conseguem, em um processo muito difícil, sair dessa bolha, outras, no entanto, a tomam como propósito de vida e não medem esforços para segui-la, como se fosse uma religião do mal.

Outro exemplo foi o da enfermeira Priscila Veríssimo, de 34 anos, que, em suas redes sociais, divulgava informações falsas sobre o vírus que nos assola, e acreditava que a CoronaVac era uma vacina com o intuito de implantar um chip produzido pela China para dominar o mundo. Obviamente, essas teorias conspiratórias emergiram dos porões da internet. Após pegar o vírus pela primeira vez e não ter tido sintomas, e depois negar a vacina, a enfermeira faleceu de Covid por reinfecção, lamentavelmente.

Esses casos supracitados são apenas para demonstrar como a crença em uma notícia mentirosa pode gerar consequências danosas, como destruir laços de amizades, vínculos familiares e contaminar o debate com informações fraudulentas, que apenas pioram a situação e fecham as pessoas em suas bolhas e no radicalismo. Existem inúmeros interesses para o recrudescimento dessas teorias e fake news. Como já disse, podem servir para fins políticos, visando a perpetuação no poder, podem ser estritamente para disseminar a mentira e o caos, ou mesmo para desestabilizar a ordem democrática. Em todas essas hipóteses, as empresas de tecnologias lucram bastante.

É inevitável o debate dos nossos legisladores para que tenhamos mais proteções a esse respeito. A população está em uma arena cheia de crocodilos, e muitos estão perecendo, por crenças absurdas que devem ser severamente combatidas pela sociedade civil organizada, políticos, imprensa, educadores e todos que possam alertar a sociedade

Decidi escrever sobre este assunto, pois todos os dias vejo absurdos serem publicados e compartilhados nas redes sociais. Tratam-se de informações que, se pessoas desinformadas acreditarem, seguramente, poderão acarretar severos danos.

Portanto, é necessário compreender com profundidade esse fenômeno, e, para encerrar, gostaria de sugerir aos meus leitores que assistam ao documentário produzido pela Netflix a respeito desse tema: O dilema das redes sociais. Informações valiosas poderão ser coletadas.

 

Nota do colunista: No próximo texto abordarei alguma área do direito específica e que poderá, neste momento, contribuir com nossa sociedade. Até lá!

3 Comentários

  1. Amanda A. Helou disse:

    Parabéns Dr. Leandro, texto que traz verdades do momento que a nossa sociedade vive.

  2. Tânia Maria Alves Helou disse:

    Excelente abordagem, as fake neus realmente têm feito grandes estragos em todas as áreas da vida humana, e no Brasil não é diferente. Tudo que temos vivido nesse momento trágico da pandemia têm a ver com essa rede de fake news, com essas bolhas de mentiras perversas. Precisamos nos conscientizar e conscientizar o máximo de pessoas sobre esse assunto. Parabéns!

  3. Charles Araújo disse:

    Disparado a melhor coluna desse jornal. Aguardo toda quarta ansiosamente. Parabéns Dr. Leandro.
    Não moro em Araguari há muitos anos, mas gosto de ler sempre notícias da cidade.

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